terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Outra

Aquele acampamento de festival de verão foi mesmo inesquecível. Você se lembra? Cheguei na Gare Oriente com destino à Setúbal com uma bolsa que o Thiago apelidou de buraco negro e um convite do Arctic Monkeys na carteira vermelha. Apenas isso, convencida de que iria descer à baixa e comer pastéizinhos de Belém, além de tirar uma foto no Mosteiro dos Jerônimos naqueles dias que iriam se seguir. Quando o inesperado me presenteia com os 3 dias do Festival! Estampei um sorriso...
Mas pensando bem, não estou certa se foram dias tão bons... Perdi um short que amava, achava a minha amiga de camping super careta e desanimada... Fiquei sozinha, lembra? 

É, na verdade, essa foi a  parte boa. No deserto litoral, querendo um recomeço, querendo muito me viver, o mar era a solução balsâmica para as minhas dores. Sinto saudades de todas as portas que eu poderia abrir e não abri.

Quando eu cheguei em casa foi uma felicidade! Estava com saudades de você! De sentar na escada e morrer de rir das suas ironias e do seu mau humor. Em que croissant aquecido e um café nos perdemos? 

Outra. Me lembra um filme. Sim. Você não seria tão óbvia! Tenho certeza que pensou em Bergman. Como você é esperta! E era por isso que eu confiava em você. .. Preciso acreditar que você lembrou de Persona. Outra, olhei no espelho e pensei: "que mulher é essa?". Senti alguém vindo por trás e mudando o meu reflexo. Já não era eu, iludida com o tempo certo das coisas, era o reflexo do eu, enrugado, com o olhar vazio, o coração vazio, a cabeça vazia. Era eu liberta. 

Aquela Cedofeita. Aquela Tendinha... Pedro caiu. Quando olhei, estava ele num ritmo esquisito, deslizando pela parede em câmera lenta. Pelo menos caiu dançando... Foi uma das cenas sem testemunhos mais engraçadas da minha vida. O tombo era uma metáfora das horas corridas que passamos entre algumas doses e marlboro branco. Inevitável não se entregar à decadência naquele lugar. (...) Rio sozinha das danças de flamenco, dos fidéis, das amapoulas, lips... E o que quer que fossem aquelas coisas que apareciam na nossa casa do Ramalde

Embora em silêncio, quando me olhei no espelho, me vi timidamente outra. E só você poderia me entender.  Fosse a Elizabeth, fosse a Alma. Fosse nenhuma, nem outra, Marrib. 

Se ainda há tempo, gostaria lhe dizer que seria uma honra conversar sobre a filosofia de Platão com você. E só mais uma coisa, ver apenas vinhos chilenos hoje na padaria foi realmente frustante...   


Da Outra, Ana. 

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Trópicos etéreos

Agarrou – me. Meus ossos, meu coração, me esvaziei toda para que você entrasse. Entrasse em mim. Nas tuas vísceras, me vi toda. Teu corpo passava no meu. Estava no alto, suspensa pelos teus braços e pressionada pelo teu corpo. Vinha-me tua boca nos meus seios, no meu queixo e na minha boca. Sua barba roçava nos meus lábios rachados e minha saliva escorria na tua. Meus pés faziam ponta nas tuas cochas. Meus olhos fechados, os teus sempre. Minha mão apertava nas tuas costas, as tuas, nas minhas entranhas. O beijo etéreo me sufocou. Bicho do mato, paralisada feito presa fácil, já não restava muito senão os balões alaranjados que vieram logo galopantes...

Madrid - Janeiro de 2012

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