quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Crua

Esperei o tempo morno. Nem um quente da pele adocicada, nem uma frieza de vozes equidistantes. O tempo prometido era  para que se pudesse avançar pela língua um pensamento tingido de vermelho, e me viesse, quase de repente, o sentimento voluptoso da certeza pela boca.

Esperei com toda a carne crua, o tempo de tirar a roupa e ficar nua, tua, crua. Nua a carne tua que mantem nos chãos úmidos o indigesto sabor da dúvida. Mastigar as amapoulas velhas, com um amargo gosto do mofo, jogar dados viciados, com uma intermitente letra repetida; pisar sobre gravetos, espinhos e folhas, sentir os pés doídos e gastos, e ao final, agarrar a terra por entre os dedos e esperar os balões subirem pelo céu. O sentido era a promessa do alvo, da mira, do mar.

Esperei.

Busquei nas margens insalubres da minha lembrança, uma linha possível de tocar e consegui alcançar uma seta, e tocaria mesmo que fosse a placa errada, o atalho, o caminho de muralhas esguias e longíquas. Que fosse tua vida lá de longe a parte que me cabia dentro do seu espesso vazio coração.

Foi assim que cheguei. Deserto de lugares e de motivos, de sonhos e linhas, nem navios disponíveis pra voar. A palavra amanhecida ficou esquecida de canto como um objeto empoeirado na sala de estar. Eu só escutava o barulho forte da água bailando nesse exato não sentido apelo de existir. A vida seguia esguia.






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